sexta-feira, 7 de março de 2008

Mulheres da Via Campesina e de outros movimentos sociais iniciam jornada de mobilização do 08 de março


Movimentos feministas preparam atos por "igualdade, autonomia e soberania popular"

por jpereira — Última modificação 06/03/2008 17:12

Expectativa é que mobilização em São Paulo reúna 5 mil; Conlutas fará atividade em separado

06/03/2008- Dafne Melo, da Redação - Brasil de Fato

O tema central do ato unificado do Dia Internacional da Mulher será “Mulheres feministas anticapitalistas em luta por igualdade, autonomia e soberania popular”. Participam da manifestação todas as entidades que integraram o ato de 2007 - quando a cidade de São Paulo recebeu a visita do presidente estadunidense George W. Bush -, com exceção da Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas), que está chamando outro ato.

O ato unificado se reunirá às 11h, na Praça Ramos – em frente ao Teatro Municipal - e participam de sua organização a Marcha Mundial de Mulheres, a Intersindical, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Sempreviva Organização Feminista (SOF) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT), dentre outras. O site da Marcha Mundial das Mulheres divulga onde vão ocorrer mais mobilizações (veja aqui).

Nalu Faria, integrante da Marcha Mundial de Mulheres explica que os temas centrais da luta feminista que estarão em pauta serão: valorização do salário mínimo, contra a retirada de direitos dos trabalhadores, soberania alimentar e popular, descriminalização do aborto, reforma agrária e combate à violência contra as mulheres. Este último é um tema considerado “fundamental” pela organização na marcha, uma vez que o ato exigirá do governador José Serra (PSDB) a assinatura do Pacto Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, proposto pelo Governo Federal, por meio da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. “Serra não assinou e não demonstra vontade política de fazê-lo”, aponta Nalu.

Os atos no dia 8, aponta Nalu, são essenciais para reafirmar a data como um dia de luta feminista.

“(O dia 8) é elemento de memória viva e permanente de luta das mulheres. Elas não começaram a lutar há pouco tempo. Esse dia nos remete à resistência das mulheres operárias e socialistas”. Lourdes Vicente, do setor de gênero do MST, conta que o movimento tirou a definição de transformar toda a semana do dia 8 em uma jornada de lutas. Dia 5, mulheres da Via Campesina ocuparam uma área ilegal da Stora Enzo no Rio Grande do Sul (ver matéria).

“Somos contra a as transnacionais e sua ação danosa para a reforma agrária. Hoje, elas são a maior ameaça às mulheres que vivem no campo. Nosso objetivo e fazer com que a sociedade tenha conhecimento das injustiças e ilegalidades que elas provocam”, explica Lourdes que enxerga na ação a união da luta feminista com a da reforma agrária.

Para Nalu, a luta das mulheres para combater o machismo e por transformações sociais são complementares: “Temos consciência de que não vamos mudar a vida das mulheres se não mudarmos a sociedade, mas a sociedade também não muda se não lutarmos para mudar seus elementos estruturantes e um deles é a opressão das mulheres”, conta.

Balanço

No último ano, duas grandes pautas específicas do movimento feminista estiveram em evidência: a violência doméstica e a questão do aborto. Com a visita do papa Bento XVI e as declarações pró aborto do ministro da Saúde José Gomes Temporão, o debate sobre o tema se acirrou. Neste ano, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) apresenta como tema da campanha da fraternidade “Escolhe, pois, a vida”, que promete esquentar ainda mais o debate.

Nalu Faria avalia que sem dúvida há uma maior articulação das organizações a favor e contra, reflexo da polarização da discussão. “Temos que ampliar o debate, pressionar o governo para enviar o projeto de lei de discriminalização para o Congresso e buscar maior unidade e organização, inclusive de pessoas que não têm vinculação direta com a causa feminista, mas simpatizam com a causa pró aborto”, aponta.
Para a integrante da MMM essa unidade será essencial para fazer frente à ofensiva reacionária. “Mesmo as nossas companheiras na Europa têm reclamado da onda conservadora, ou seja, é algo mundial”, finaliza.

Quanto à violência doméstica, Nalu avalia que a aprovação da Lei Maria da Penha foi importante, mas ainda há muito o que conquistar, como forçar municípios e Estados a aderir ao Pacto de Não Violência. Ao seu ver, essa é um dos temas mais difíceis da luta feminista, uma vez que a violência contra a mulher é resultado das relações de opressão que existem na sociedade. “Como ela é um resultado de um processo é difícil atuar nela, pois temos que bater de frente, na realidade, com a raiz das relações de opressão”, finaliza

Brigada Militar Gaúcha age de forma truculenta com agricultoras

por jpereira — Última modificação 06/03/2008 14:37

Em ação em área ilegal da Stora Enso, no Rio Grande do Sul, Brigada Militar prende e agride militantes. Ainda não se sabe a quantidade de mulheres feridas. Cerca de 250 crianças foram separadas de suas mães e deitadas no chão com as mãos na cabeça

04/03/2008 (atualizada em 06/03/2008)Mayrá Lima, de Brasília (DF)

O acampamento das mulheres da Via Campesina na Fazenda Tarumã, em Rosário do Sul (RS), foi invadido de forma violenta por um contingente da Brigada Militar nesta terça-feira (4). Centenas de agriculturas foram feridas e impedidas pelos policiais de receber atendimento médico. As cerca de 250 crianças que estavam no acampamento foram separadas das mães e colocadas deitadas com as mãos na cabeça. Ferramentas de trabalho foram apreendidas e barracos destruídos.

Entre as feridas, a camponesa Maraísa Talaska Porto, que participou nesta quinta-feira (6) de uma audiência pública na Subcomissão Permanente de Defesa da Mulher no Senado. Ela apresentou aos parlamentares os ferimentos provocados por brigadianos gaúchos durante manifestação.

Pela manhã da terça-feira, cerca de 900 mulheres da Via Campesina ocuparam a fazenda Tarumã, de 2,1 mil hectares, em Rosário do Sul, a aproximadamente 400 km de Porto Alegre. Elas chegaram na área por volta das 6 horas da manhã e imediatamente iniciaram o corte de eucaliptos e o plantio de árvores nativas. Em nota distribuída à imprensa as mulheres declaram que a “ação é legítima. A Stora Enso é que é ilegal. Plantar esse deserto verde na faixa de fronteira é um crime contra a lei de nosso país, contra o bioma Pampa e contra a soberania alimentar de nosso Estado que está cada vez mais sem terra para produzir alimentos. Estamos arrancando o que é ruim e plantando o que é bom para o meio-ambiente e para o povo gaúcho”.

Durante o dia, a Brigada Militar já havia agredido um grupo menor de camponesas na entrada da fazenda e coagido os jornalistas que estavam na área cobrindo o episódio. Um cinegrafista foi detido por mais de uma hora e a sua fita com o registro da agressão apreendido. A Via Campesina condena a ação e denuncia que a tucana coloca o aparato policial do Estado a serviço de uma de suas maiores financiadoras de campanha, a transnacional Stora Enso.

“As empresas de celulose prometem gerar emprego e desenvolvimento. Mas onde elas se instalam só aumenta o êxodo rural e a pobreza. Os trabalhos que geram são temporários, sem direitos trabalhistas, em condições precárias. Um exemplo é a Fazenda Tarumã em Rosário do Sul que gera somente dois empregos permanentes e alguns empregos temporários. Se essa área fosse destinada para a reforma agrária poderiam ser assentadas 100 famílias, gerando no mínimo 300 empregos diretos permanentes. Portanto, a reforma agrária e a agricultura camponesa é que são a melhor alternativa para preservar a biodiversidade, gerar trabalho e renda para a população do campo e alimentos saudáveis e mais baratos para quem mora nas cidades”, explicam, na nota, as mulheres da Via Campesina.

Ilegalidades no Brasil

A Stora Enso é uma companhia sueco-finlandesa e pela legislação brasileira (lei nº 6.634 de 1979; e o artigo 20, parágrafo 2, da Constituição Federal) estrangeiros não pode adquirir terras em uma faixa de 150 km da fronteira do Brasil. Mas essa transnacional vem comprando dezenas de áreas no Rio Grande do Sul próximo à divisa com o Uruguai, país onde a empresa também tem plantios. A meta é formar uma base florestal de mais de 100 mil hectares e implantar fábricas na região. (Leia mais: Redução da faixa de fronteira avança no Senado; Stora Enso beneficiada).

Inicialmente a Stora Enso adquiriu as terras em nome da empresa Derflin, que é o braço da transnacional para produzir matéria-prima. Como a Derflin também é estrangeira, não conseguiu legalizar as áreas. Por isso, a Stora Enso criou uma empresa laranja: a agropecuária Azenglever, de propriedade de dois brasileiros: João Fernando Borges e Otávio Pontes (diretor florestal e vice-presidente da Stora Enso para a América Latina, respectivamente). Eles são atualmente os maiores latifundiários do Rio Grande do Sul.

Cerca de 50 fazendas, totalizando mais de 45 mil hectares já foram registradas em nome da Agropecuária Azenglever. Entre essas áreas está a Tarumã, ocupada pelas mulheres. Há um inquérito na Polícia Federal responsável para investigar o crime, mas a empresa continua agindo livremente.

Reivindicações

As mulheres da Via Campesina pedem anulação das compras de terra feitas ilegalmente pela Stora Enso na faixa de fronteira e expropriação dessas áreas para a reforma agrária. Somente nos 45 mil hectares que estão em nome da Azenglever daria para assentar 2.250 famílias, gerando 6.750 empregos diretos. Atualmente 2,5 mil famílias estão acampadas no Rio Grande do Sul e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) alega não ter terras para fazer assentamento.

Além disso, as militantes reivindicam a retirada dos projetos no Senado e na Câmara Federal que propõem a redução da faixa de fronteira. Na avaliação das mulheres, essa medida só beneficia empresas estrangeiras.

A ação desta terça-feira marca o início da Jornada Nacional de Luta das Mulheres da Via Campesina contra o Agronegócio e Por Soberania Alimentar. (Foto: Agência Brasil)

Manifesto das Mulheres da Via Campesina

Nós mulheres da Via Campesina do Rio Grande do Sul estamos mais uma vez mobilizadas, nesta semana do 8 de março, para intensificar nossa luta contra o agronegócio e em defesa da soberania alimentar da população brasileira.

A soberania alimentar é o direito dos povos de produzir sua comida respeitando a biodiversidade e os hábitos culturais de cada região. Hoje em nosso país as riquezas naturais estão sob domínio das empresas multinacionais do agronegócio e a população tem cada vez menos acesso à terra, à água e aos alimentos.

Nós mulheres somos as primeiras a serem expulsas das atividades agrícolas nas áreas onde avança o agronegócio. Nosso trabalho é importante em uma agricultura camponesa porque sabemos produzir alimentos. Mas as empresas do agronegócio não estão preocupadas em produzir comida, só em produzir lucro transformando o campo em desertos verdes (de eucalipto, de soja, de cana). Um dos desertos que mais cresce em nosso Estado é o de eucalipto para celulose.

As empresas de celulose estão fechando fábricas nos Estados Unidos e na Europa e vindo para a América Latina. Aqui encontram muita terra, água, clima favorável e governos dispostos a atender seus interesses. Mais de 90% da produção de celulose do Brasil é para exportação. Assim, reduzimos a produção de comida, destruímos a biodiversidade, aumentamos a pobreza e a desigualdade para atender a demanda de lucro das empresas e um estilo de vida consumista nos países ricos. Esse é o papel horroroso que o Brasil cumpre hoje no mundo.

Uma das empresas responsáveis pelo avanço do deserto verde no Rio Grande do Sul é a Stora Enso, multinacional sueco-finlandesa. Pela lei brasileira estrangeiros não podem ter terra em uma faixa de 150 km da fronteira do Brasil com outros países. Acontece que a Stora Enso já tem milhares de hectares plantados no Uruguai e é exatamente próximo da fronteira gaúcha com este país que essa gigante do ramo de papel e celulose quer formar uma base florestal de mais de 100 mil hectares.

Inicialmente a Stora Enso tentou comprar as terras em nome da empresa Derflin, o braço da multinacional para produção de matéria prima, que por ser estrangeira não conseguiu legalizar as áreas.

Para viabilizar sua implantação a multinacional criou uma empresa laranja que está comprando as terras em seu nome: a agropecuária Azenglever Ltda, cujos donos são dois importantes funcionários da Stora Enso. Eles se tornaram os maiores latifundiários do estado, sendo “proprietários” de mais de 45 mil hectares. Essa operação ilegal é de conhecimento dos Ministérios Públicos Estadual e Federal, do Incra, da Polícia Federal, mas nada de concreto foi feito para impedir o avanço do deserto verde. Decidimos então romper o silêncio que paira sobre esse crime.

Nossa ação é legítima. A Stora Enso é que é ilegal. Plantar esse deserto verde na faixa de fronteira é um crime contra a lei de nosso país, contra o bioma pampa e contra a soberania alimentar de nosso estado que está cada vez mais sem terras para produzir alimentos. Estamos arrancando o que é ruim e plantando o que é bom para o meio ambiente e para o povo gaúcho.
Alguns parlamentares gaúchos ao invés de combaterem a invasão dos estrangeiros estão propondo reduzir a Faixa de Fronteira para legalizar o crime. Usam o argumento de que a faixa de 150 km impede o desenvolvimento econômico dos municípios. Mas isso é uma grande mentira. Todos sabem que a Metade Sul não se desenvolve por causa do latifúndio e das monoculturas. Tanto que a faixa de fronteira também vigora na metade norte do estado e nessa região a economia é dinâmica.

As empresas de celulose prometem gerar emprego e desenvolvimento. Mas onde elas se instalam só aumenta o êxodo rural e a pobreza. Os trabalhos que geram são temporários, sem direitos trabalhistas, em condições precárias. Um exemplo é a Fazenda Tarumã em Rosário do Sul, de 2,1 mil hectares onde a Stora Enso gera somente dois empregos permanentes e alguns empregos temporários.

Se essa área for destinada para a reforma agrária podem ser assentadas 100 famílias gerando no mínimo 300 empregos diretos permanentes. Portanto, a Reforma Agrária e a Agricultura Camponesa é que são a melhor alternativa para preservar a biodiversidade, gerar trabalho e renda para a população do campo e alimentos saudáveis e mais baratos para quem mora nas cidades.

O projeto que tramita no Senado propondo reduzir a Faixa de Fronteira brasileira não inclui a Amazônia porque entende que isso seria uma ameaça para a floresta. Ou seja, admite que a redução da Faixa de Fronteira irá aumentar a destruição ambiental. Para nós todos os biomas brasileiros são importantes e entendemos que o Cerrado e o Pampa também precisam ser preservados.

Nós mulheres da Via Campesina reivindicamos das autoridades brasileiras:

- Anulação das compras de terra feitas ilegalmente pela Stora Enso na faixa de fronteira e expropriação dessas áreas para a reforma agrária. Somente nos 45 mil hectares que estão em nome da empresa laranja, a Agropecuária Azenglever daria para assentar cerca de 2 mil famílias, gerando 6 mil empregos diretos. Atualmente 2.500 famílias estão acampadas no Rio Grande do Sul e o Incra alega não ter terras para fazer assentamento.

- Retirada dos projetos no Senado e na Câmara Federal que propõem a redução da Faixa de Fronteira. Essa medida só vai beneficiar empresas como a Stora Enso que querem se apropriar das terras para transformá-las em deserto verde, destruir nossas riquezas naturais como o aqüífero guarani e o bioma Pampa. Para o povo gaúcho essa redução da faixa de fronteira só vai provocar aumento do êxodo rural, do desemprego, da destruição ambiental e o fim soberania alimentar pois vai faltar terra para produzir alimentos.

Sabemos que por lutar contra o deserto verde podemos sofrer a repressão do governo gaúcho. É prática desse governo tratar os movimentos sociais como criminosos e proteger empresas que cometem crimes contra a sociedade. Vamos resistir. Nossa luta é em defesa da vida das pessoas e do meio ambiente. Estamos aqui em 900 mulheres, mas carregamos conosco a energia e a coragem das milhares de camponesas que em todo o mundo lutam contra a mercantilização das riquezas naturais e da vida. Como dizia a companheira sem terra Roseli Nunes, assassinada covardemente em março de 1987 aqui no Rio Grande do Sul, “preferimos morrer lutando do que morrer de fome!”.

Mulheres da Via Campesina do Rio Grande do Sul

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